Para o mal ou para o bem, Ron DeSantis tem fortes chances de superar ou se igualar ao ex-presidente na corrida pela vaga dos republicanos
A corrida eleitoral americana já começou. Muito diferente do Brasil, a campanha que realmente lança um candidato às finais do campeonato acontecem internamente nos partidos. Trata-se das chamadas primárias, que se iniciam no ano anterior à eleição geral para presidente e que definem quem será o representante do partido Democrata e do partido Republicano.
No campo Republicano, o mais notório candidato é o ex-chefe da Casa Branca Donald Trump. Não só pelo fato de já ter sido presidente, mas por toda a sua trajetória prévia e fora da política.
Porém, ao contrário das últimas duas eleições em que concorreu, em 2016 e em 2020, Trump vai vivenciar uma corrida de fato disputada dentro de seu próprio partido. Tal situação se dá pela notoriedade cada vez mais proeminente do atual governador da Flórida, Ron DeSantis.
No debate doméstico americano, DeSantis já tem igual ou mais protagonismo que o ex-presidente Trump nos principais veículos de imprensa à direita do espectro político — como a Fox News. Toda a visibilidade de DeSantis explica-se e se inicia ainda em 2020 durante a pandemia.
Para chegar a esse patamar, vale contextualizar um pouco da trajetória do governador da Flórida. DeSantis foi representante da Câmara dos Deputados americana por três diferentes mandatos e em 2019 se elegeu governador. Até então, tinha pouco protagonismo nacional e nenhuma relevância fora do seu próprio partido. Até que a pandemia mudou sua rota.
A Flórida foi um dos estados com menos restrições durante a pandemia e um dos primeiros a reabrir, ainda em maio de 2020. Nesse período, eu estava morando na Flórida. No dia 1º de maio de 2020, quando o estado oficialmente reabriu, fui a um restaurante e tive uma experiência normal como se estivéssemos em qualquer outro ano.
O fato de a Flórida ter tido um dos mais brandos lockdowns do país colocou o governador DeSantis nos holofotes tanto da esquerda — que o demonizou — quanto da direita, que passou a adorá-lo. Além disso, o fato de o estado ter um clima tropical e estar reaberto durante o início do verão americano, causou um fluxo migratório doméstico considerável nos EUA.
Logicamente, não apenas o fator pandemia influenciou, mas cidadãos dos estados historicamente democratas da Califórnia e Nova York, ano a ano, batem recordes de trocas de domicílio. Se comparados com a Flórida, ambos estados sofrem com elevado custo de vida, altos impostos e crescimento da população de rua. Tudo isso tem sido noticiado recorrentemente na imprensa americana.
Além disso, os bons resultados e a pronta recuperação após a passagem do furacão Ian em 2022, consolidaram a reeleição do governador DeSantis, que atropelou o candidato democrata. Não o bastante, DeSantis solidificou o estado ainda mais republicano em áreas historicamente democratas da Flórida — como eram Miami e Tampa.
Ocorre, porém, que para vencer as primárias contra Trump e se consolidar como candidato republicano nacionalmente, DeSantis vem radicalizando cada vez mais em certos temas como aborto, imigração, pautas LGBT e educação infantil nas escolas públicas da Flórida. Isso ocorre porque o atual governador precisa primeiro competir entre os seus pares. Nos EUA, em geral, é comum que nas primárias os candidatos radicalizem para, passada essa fase, possam voltar ao discurso mais moderado para agradar delegados e eleitores menos radicais.
Como exemplo, DeSantis, após a decisão da Suprema Corte Americana que derrubou a jurisprudência do caso Roe versus Wade sobre aborto, assinou a nova lei a respeito do tema na Flórida. A partir de 2023, as mulheres podem executar o procedimento abortivo por qualquer razão apenas até a sexta semana da gestação.
Outra medida polêmica tomada por DeSantis foi o envio de diversos imigrantes venezuelanos na fronteira do México com o Texas para uma ilha no estado de Massachusetts. Em tese, o problema em nada se relacionava com as suas atividades de governador na Flórida. Porém, com essa medida, DeSantis quis sinalizar aos estados pró-imigração, em geral de maioria democrata, que esta responsabilidade também seria deles — não apenas dos estados fronteiriços como Flórida e Texas.
Uma última polêmica na qual DeSantis se envolveu diz respeito à Disney World, na cidade de Orlando. O governador decidiu retirar os benefícios fiscais concedidos à Disney há mais de 50 anos em represália às críticas que a empresa de entretenimento vem fazendo à maneira como DeSantis trata o tema LGBT para crianças nas escolas públicas do estado. Como consequência, se desenrola por mais de um ano um longo e desgastante processo judicial envolvendo ambas as partes, cujo resultado é difícil de prever.
Para o mal ou para o bem, DeSantis tem fortes chances de superar ou se igualar ao ex-presidente Trump na corrida pela vaga dos republicanos. Basta saber se toda essa radicalização para sinalizar que DeSantis vem emplacando vai colar dentro do partido.
Izabela Patriota é advogada formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), com mestrado em Direito Constitucional na Universidade de Brasília (UnB) e doutoranda em Direito Econômico e Economia Política na Universidade de São Paulo (USP). Iza é diretora de Relações Internacionais no LOLA Brasil
Este artigo foi originalmente publicado na Revista Crusoé.
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